terça-feira, 19 de abril de 2011

Harmonia em Trítono – Parte 2

Ela se aproximava. Pude notar os traços de seu rosto e tive uma surpresa. Era a imagem de minha mãe. Não a via desde meus seis anos de idade, quando ela e papai desapareceram. Mas não sentia seu calor, na verdade sentia náuseas. Era algo que representava um mal incompreensível se apoderando da imagem de mamãe.
Seu caminhar durou até o momento em que parou a dois metros da porta onde me encontrava petrificado. Foi minha vez de andar até ela, não porque tinha vontade, mas sim, porque estava sendo atraído, forçado. Andei até poder encostar levemente a minha testa na sua. Não nos tocávamos. Apenas tínhamos nossos rostos colados um no outro. Ambos estávamos de bocas abertas e eu podia sentir o calor de sua respiração descendo goela abaixo.
Após alguns minutos de silêncio, ela começou a falar. Não podia entender, eram apenas sussurros. Talvez não tivesse o objetivo de ser compreendida, apenas de jogar aquelas palavras com ar de oração sombria dentro de mim, para ferir minha alma. Ela falava algo rapidamente, depois parava, abria a boca, soltava um suspiro muito parecido com o vento que entra levemente pela janela durante uma madrugada fria e seca, e então voltava a falar.
Naquele estado de horror, não esperava que algo pior pudesse vir de minha suposta figura materna, mas podia. Ela suspirou após sua última fala e colocou sua língua dentro de minha boca. Na verdade, nossas línguas se entrelaçaram numa dança sensual que uma mãe não tem com seu filho, algo como um ritual de carne que as religiões chamariam de satânico. Nossos rostos estavam congelados enquanto nossas línguas se moviam.
Um fluído arroxeado passava de sua língua para a minha. Aquilo estava sugando minha vitalidade. Sentia como se estivesse enfraquecendo e cedendo eternamente àquele estado endurecido no qual me encontrava, poderia permanecer para sempre ali, até a morte de meu espírito. No entanto, em certo momento, comecei a sufocar como se aquilo tivesse entupido minha via respiratória. Minhas veias saltavam na cabeça, assim como meus olhos inchavam. Foi aí que, em milésimos de segundo, fui arrastado, despencando do plano astral ao físico como se minha alma caísse sobre meu corpo. Acordei.
Por Luiz Vassalo

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